Nem sempre os políticos calculam bem as consequências de suas decisões. No caso do presidente afastado da Ucrânia, sua última escolha lhe custou o cargo e a tranquilidade de toda a população ucraniana que hoje está no centro de um conflito com a Rússia. A crise na Ucrânia começou em novembro.
Tudo começou em novembro de 2013, quando o então presidente ucraniano, Viktor Yanukovich, decidiu abandonar um acordo de livre comércio com a União Europeia para se alinhar à Rússia, país que dominou a Ucrânia por gerações quando esta fazia parte da União Soviética.
O acordo estratégico com os russos incluía uma ajuda financeira, descontos no preço do gás produzido pela Rússia e comprado pela Ucrânia e a promessa de uma zona de comércio livre.
Desejando a integração com a União Europeia e temendo a influência russa, parte dos ucranianos foi às ruas para se manifestar contra a decisão. A quebra do acordo foi o estopim para um governo que já sofria desgastes com problemas como a economia sem crescimento, corrupção endêmica e a falta de reformas políticas.
O gás natural produzido pela Rússia tem papel relevante na crise. Hoje, a Europa importa 30% do gás russo, número que já foi de 45%. A Ucrânia está entre os dez países que mais consomem gás natural no mundo e também redistribui o produto. Em seu território, passam 80% do gás russo vendido aos europeus por meio de seus gasodutos.
No controle dos preços do gás natural, os russos com frequência ameaçam suspender seu fornecimento aos ucranianos. Em 2006 e em 2009 os dois países entraram em crise devido a um desentendimento no valor do gás e a suspeitas de que a Ucrânia havia desviado o gás destinado a países vizinhos.
Neste cenário, o desconto de US$ 2 bilhões anuais no preço do gás natural oferecido pelo presidente russo Vladimir Putin para o governo ucraniano abandonar o acordo com a União Europeia funcionou como atrativo.
A violenta repressão policial às manifestações fez crescer o movimento e as críticas ao governo, e alterou a pauta de reivindicações: os protestos não pediam apenas o alinhamento à União Europeia, mas também a saída do presidente. Houve invasão de prédios públicos e os confrontos entre manifestantes e policiais deixaram um saldo de dezenas de mortes.
Após três meses de protestos, o Parlamento votou pela destituição do presidente Viktor Yanukovich e anunciou eleições presidenciais antecipadas para 25 de maio. Aleksandr Turchinov, presidente do Parlamento, assumiu como presidente interino. Países da União Europeia prometeram uma ajuda financeira para a Ucrânia empreender reformas econômicas e planejar as eleições presidenciais. Refugiado na Rússia, Yanukovich defende que continua sendo presidente do país.
Seria o fim da crise? Não exatamente. Enquanto o Ocidente apoiava o novo governo, a Rússia criticou o país vizinho e o governo provisório, prometendo sanções econômicas como retaliação.
Na Crimeia, república autônoma da Ucrânia, confrontos entre militantes prós e antirrussos acirraram o conflito. A Rússia, que mantém uma base naval no litoral da Crimeia, no sul, enviou tropas militares para executarem manobras na fronteira. O número de soldados russos no local chegou a 30 mil.
Localizada estrategicamente ao lado do mar Negro, a Crimeia é um Estado autônomo e 60% da população é de origem russa. A influência do país soviético é forte não apenas na península, mas também nas regiões leste e sul da Ucrânia, que mantém a língua e a cultura.
No final de fevereiro, o Parlamento em Simferopol (capital da Crimeia) foi invadido por separatistas com bandeiras da Rússia.
Os parlamentares da Crimeia criaram um referendo para a população decidir se deseja pertencer à Ucrânia ou Rússia. Historicamente, a região nunca pertenceu de fato à Ucrânia e foi anexada durante a Guerra Fria porque a União Soviética controlava as duas regiões. Se aprovado pela Rússia, o referendo deve ser votado no dia 16 de março.
Para o presidente interino da Ucrânia, a ação é ilegal, pois pela constituição ucraniana, a decisão de rever fronteiras só poderia ser examinada com um referendo nacional.
Turchinov ainda alertou para a atuação similar da Rússia durante a intervenção na Geórgia no conflito separatista da Abkházia e da Ossétia do Sul, que têm uma grande população de etnia russa, em 2008.
A guerra com a Geórgia durou cinco dias, e a Rússia permanece no controle da Abkházia e da Ossétia do Sul até hoje, mesmo que a ONU e a maioria dos países considere-os como parte da Geórgia.
Créditos- UOL