Ambição do Prêmio Nobel da Paz explica a tumultuada diplomacia do governo, escreve Thomas Traumann.

ex-ministro das Relações Exteriores e assessor especial da Presidência, Celso Amorim, deve se encontrar nesta 4ª feira (10.mai.2023), em Kiev, com o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky. É mais uma etapa na tentativa do presidente Lula da Silva de se posicionar como mediador da guerra com a Rússia.

Será um encontro de poucas horas e com chances de êxito quase nulas. Amorim chega sem uma proposta escrita para uma possível trégua no conflito e sob a suspeita de ter visão benevolente sobre o governo russo de Vladimir Putin. Publicamente, Zelensky deve repetir que para iniciar as conversas de paz a pré-condição é a retirada do exército russo do país.

Para chegar ao encontro de Zelensky, Amorim, de 80 anos de idade, viajou de avião de Paris até a fronteira da Polônia com a Ucrânia. De lá, ele e outros 4 diplomatas brasileiros embarcaram num trem que percorreu 700km até Kiev. Antes da viagem, Amorim revelou a interlocutores que considerava o desgaste da viagem desproporcional aos resultados que poderiam ser alcançados.

A Ucrânia se transformou na maior fonte de desgaste internacional de Lula desde sua posse, saudada por praticamente todos os líderes mundiais como um avanço em relação ao governo Bolsonaro. O encontro de Amorim com Putin, em Moscou, a visita a Brasília do chanceler russo, Sergey Lavrov, e, principalmente, as declarações de Lula atacando a ajuda americana e europeia à Ucrânia tiraram do Brasil o papel de um possível mediador imparcial do conflito.

A boa vontade do governo Biden com Lula se dissipou. Nas últimas semanas, Lula ficou na defensiva ao tentar justificar a posição brasileira para os presidentes da Romênia e Portugal e os primeiros-ministros de Portugal, Espanha e Reino Unido e Holanda. Com este último, na 3ª feira (9.mai.2023), Lula saiu falando o contrário do que defendia. Agora, segundo Lula, “cada país tem sua razão. A Ucrânia, efetivamente, não pode aceitar ocupação do seu território, ela tem que resistir. A União Europeia tem sua razão de tomar a decisão que tomou (de armar a Ucrânia) e o Brasil e outros países têm sua razão para tentar encontrar um meio-termo”.

Então, por que continuar? Se os países ocidentais e a Ucrânia publicamente desconsideram o Brasil como mediador confiável, para que Lula deve insistir em intervir numa guerra que ocorre a mais de 10.000km de distância? Ainda mais sem nenhum sinal russo de uma retirada e com a China se movendo de fato para ser ela a real protagonista de qualquer eventual acordo.A resposta está na ambição de Lula de ser candidato ao Prêmio Nobel da Paz. A possibilidade foi citada por amigos de Lula ao longo da campanha de 2022, numa comparação do então candidato com o líder sul-africano Nelson Mandela, que deixou a prisão para unir seu país depois de décadas de um dos piores sistemas segregacionistas da História e, por isso, recebeu o Nobel da Paz, de 1993. À época, os assessores diziam que ao retomar as medidas para proteger a Amazônia da sanha de madeireiros, fazendeiros e garimpeiros, Lula se tornaria um herói global. Se além disso pudesse usar a sua conhecida habilidade de negociação para parar a guerra na Europa, o Nobel seria inevitável. Lula acreditou.

Poder 360




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