Para entender a proposta de transformação do DAEV

1. DO QUE TRATAM OS PROJETOS DE LEI (PL) nº 66/2023 e nº 67/2023?
O PL 66/2023 trata da transformação do Departamento de Águas e Esgoto de Valinhos (DAEV) em empresa pública (DAEV SA) e da sua venda, com participação do parceiro privado em até 100% das ações, e autoriza a concessão por 35 anos dos serviços de saneamento à DAEV SA. O PL 67/2023 aborda a transição dos servidores do DAEV neste processo.

2. OS PROJETOS EM QUESTÃO TRATAM DA PRIVATIZAÇÃO DO DAEV?
Sim, são 3 autorizações concomitantes que poderiam ser realizadas desde já:
A primeira é a transformação em empresa pública (será criada a estatal DAEV SA). A segunda é a transformação em sociedade de economia mista com a venda de até 49,9% das ações, fazendo também a concessão dos serviços (até aqui o governo detém o controle acionário). A terceira autorização é a venda de todas as ações de posse da Prefeitura, que é a privatização da entidade. 

3. O QUE MOTIVOU O PROJETO DE LEI?
Entre os motivos, está a busca de recursos para ampliação e modernização da ETE Capuava, com estimativa de orçamento acima de R$ 100 milhões. Outra justificativa é a transferência à nova empresa das obrigações do pagamento da “dívida do século”, que hoje supera os R$ 200 milhões, sendo paga em parcelas mensais de quase R$ 3 milhões, restando cerca de 7 anos para quitação total.

4. QUAIS OS IMPACTOS PARA A POPULAÇÃO?
Existem ganhos e incertezas! A participação de um investidor privado na DAEV SA traz uma série de benefícios, como o aporte de capital para realização dos investimentos necessários, inovação e novas tecnologias que podem ser utilizadas na gestão de perdas hídricas, entre outros ganhos. As tarifas certamente serão reajustadas para custear os novos investimentos e remunerar o lucro do novo acionista. Neste caso, não está claro no Projeto de Lei nem nos estudos da FIA quais serão as novas tarifas. Toda concessão de serviços pode ser melhor ou pior para a população, dependendo do modelo adotado ao longo do processo.

5. ENTÃO HAVERÁ UMA CONCESSÃO DOS SERVIÇOS?
Sim, haverá uma concessão. Nos termos do novo marco legal do saneamento, de 2020, os serviços de saneamento quando não são prestados diretamente pelo município, podem ser terceirizados mediante contrato de concessão. Em Valinhos, a previsão é que a concessão à nova empresa DAEV SA aconteça pelo período de 35 anos. Mesmo que ocorra a privatização total, o contrato de concessão permanece válido pelo mesmo período.

6. POR QUE UMA CIDADE DECIDE PRIVATIZAR OU FAZER UMA CONCESSÃO DOS SERVIÇOS DE SANEAMENTO?
O principal motivo para a concessão dos serviços de saneamento é garantir investimentos que permitam a melhoria e a universalização desses serviços. O novo marco do saneamento impôs aos municípios que algumas metas sejam atingidas até 2033: 99% da população deve receber água potável, e pelo menos 90% da população deve ter o esgoto coletado e tratado. Em todo o Brasil, 33 milhões de pessoas não têm acesso a água potável, e 45% da população não possui coleta de esgoto. O novo marco do saneamento criou mecanismos e segurança jurídica para que o capital privado possa trazer as melhorias tão necessárias à população.

7. VALINHOS PRECISA, DE FATO, DE UMA PRIVATIZAÇÃO E CONCESSÃO DESTES SERVIÇOS?
Não necessariamente. Valinhos já atende cerca de 95% da população com água potável, e 88% da população tem seu esgoto coletado e tratado. Isso foi alcançado graças ao trabalho de tantos gestores e servidores que atuaram junto ao DAEV durante muitas décadas. Nesse cenário, os investimentos necessários para a universalização desses serviços em Valinhos não são tão altos como em milhares de cidades que historicamente não tiveram os gestores e investimentos que Valinhos teve, e podem ser diluídos ao longo do tempo para atingir essas metas.

8. UMA CONCESSÃO DESTES SERVIÇOS EM VALINHOS É INTERESSANTE PARA OS INVESTIDORES?
Certamente, pois, em comparação a outras cidades, haverá um baixo investimento a ser realizado num primeiro momento, e os retornos financeiros no médio e longo prazo serão garantidos. Os estudos realizados pela FIA estimam mais de R$ 1 bilhão em dividendos nos próximos 35 anos.

9. O QUE ACONTECERÁ COM OS SERVIDORES DO DAEV?
Em cada etapa de transformação do DAEV, haverá um impacto:

Num primeiro momento, todos os 206 servidores do DAEV serão transferidos para um quadro especial de servidores da Prefeitura e serão convidados pela DAEV SA a atuar na nova empresa. Eles poderão optar entre trabalhar na DAEV SA cedidos pela Prefeitura ou permanecer na Prefeitura. Os que optarem por atuar na DAEV SA receberão 2 UFMVs, cerca de R$ 450, como incentivo.
Num segundo momento, quando o conselho administrativo da DAEV SA apresentar o Plano de Cargos e Carreira, os servidores terão 60 dias para escolher migrar para o regime CLT ou permanecer no regime estatutário da Prefeitura.

10. PARECE INTERESSANTE. ESSA SITUAÇÃO PERMANECE MESMO COM A PRIVATIZAÇÃO?
Essa é a grande dúvida. No caso da privatização, os servidores que não optarem pelo regime CLT poderiam perder essas garantias, pois existem entendimentos jurídicos que concluem que não pode haver cessão de servidores estatutários para uma empresa privada. Além disso, com a perda do controle acionário pela Prefeitura, o Conselho Administrativo pode mudar as regras pré-estabelecidas, incluindo o plano de cargos e carreiras. Nesse caso, há um risco de que os servidores que prestaram concurso para funções bastante específicas, como leituristas e analistas de ETE, e que não optarem pelo regime CLT, fiquem sem ocupação na Prefeitura, por não existirem funções equivalentes.

11. O MODELO QUE VALINHOS ESTÁ ADOTANDO JÁ FOI ADOTADO EM OUTRO MUNICÍPIO?
Não, esse modelo não parece ter sido adotado em outros municípios! Os municípios que fizeram concessão após o novo marco realizam o processo com muita transparência para garantir a maior competitividade entre os investidores e, assim, maiores ganhos em termos de investimento para o município. Em Valinhos, o processo está sendo feito de forma bastante fragmentada: primeiro acontece a transformação em empresa pública, depois em sociedade de economia mista, e em seguida a privatização. Dessa forma, perde-se a atratividade para o investidor privado e diminuem-se os ganhos para o município. Isso ocorre porque, na primeira licitação, o investidor terá direito a apenas 49,9% das ações. Ou seja, ele terá que fazer o investimento mínimo, mas sem obter o controle e a gestão da empresa. Para isso, será necessária uma segunda licitação, que não está clara quanto ao prazo em que será realizada. 

12. ENTÃO, O MODELO ADOTADO EM VALINHOS É RUIM?
O modelo poderia passar por ajustes e ser melhor para todos: servidores, população e investidores. Com falta de clareza, ele acaba sendo ruim para todos, pois maximiza os riscos e minimiza os benefícios.

É ruim para o servidor de carreira, pois traz insegurança jurídica, não deixando claro quando haverá a privatização.
É ruim para o mercado investidor, pois diminui a concorrência, limitando a primeira compra em 49,9%, e não deixa claro quando ele poderá ser o gestor com a privatização.
É ruim para a população por uma série de motivos, dos quais destaco os mais relevantes:
a. O Projeto de Lei não trata das políticas tarifárias, trazendo insegurança à população. Quando haverá novo aumento e quais serão as novas tarifas?
b. O modelo adotado minimiza os possíveis ganhos para o município, visto que a limitação de compra em 49,9% deve diminuir a concorrência e a competitividade entre os investidores, diferentemente do que ocorreu em diversas cidades. Em Olímpia, por exemplo, o modelo de concessão teve a concorrência de 9 empresas, dobrando o valor mínimo previsto de outorga para o município. Nosso modelo, que não é transparente, não deve atrair essa concorrência, e consequentemente, os investimentos não serão maximizados.
c. A decisão de privatizar ou não a DAEV SA, e quando isso será feito, será exclusiva do Prefeito, sem qualquer novo debate com a Câmara dos Vereadores e a população.
d. A possibilidade de privatização completa minimizaria ou anularia os dividendos que poderiam ser obtidos pelo município e investidos em favor da população, como ocorre em Campinas.
e. A falta de transparência impede o debate qualificado e participativo que poderia maximizar os benefícios. O próprio governo não assumiu publicamente aquilo que diz o texto enviado por eles e que trata, sim, da autorização para a privatização total do DAEV.

13. QUE MODELO SERIA MELHOR PARA VALINHOS?
O estudo da FIA concluiu que o melhor modelo para Valinhos é uma Sociedade de Economia Mista, com controle acionário da Prefeitura e expertise do setor privado. Infelizmente, como mencionado anteriormente, o Executivo está pedindo mais do que o estudo concluiu, solicitando autorização para a privatização completa do DAEV. Como não temos estudos que fundamentam esta decisão e nem sequer clareza das implicações jurídicas aos servidores, é fácil concluir que o melhor caminho é excluir do texto do Projeto de Lei a possibilidade de privatização nesse momento.

Além disso, seria interessante submeter os estudos realizados pela FIA a uma audiência pública com a participação de especialistas, representantes do poder público, da sociedade civil e servidores do DAEV. Quanto mais segurança o modelo trouxer para a população, os servidores e os investidores, melhores serão os ganhos para todos.

14. QUAL O VALOR DO DAEV?
No estudo de valuation apresentado pela FIA, o valor de mercado do DAEV foi avaliado em entre 150 e 175 milhões de reais. Esse valor serviria de base para as futuras operações de transformação da empresa. No entanto, não há garantias legais de que esse valor será arrecadado. Como esse estudo não foi anexado ao Projeto de Lei, muitos levantaram questionamentos se, de fato, esse valor estaria adequado à realidade ou subestimado. A definição do valor mínimo de venda será estipulada apenas no edital de licitação.

15. QUAIS OS BENS DO MUNICÍPIO SERÃO REPASSADOS À DAEV SA?
Atualmente, não está claro a lista de bens móveis e imóveis que passarão a integrar o patrimônio da DAEV SA, nem mesmo seu valor estimado. Em caso de privatização completa, esses bens não seriam mais da Prefeitura. Foi apresentada uma emenda pelo governo para que alguns bens estratégicos, como as Estações de Tratamento de Água e Esgoto, além das propriedades onde se encontram as barragens e reservatórios de água bruta, sejam devolvidos ao município após o período de concessão.

16. PARA FINALIZAR, COMO ESTÁ A TRAMITAÇÃO DO PROJETO E QUAL A SUA POSIÇÃO?
A tramitação do projeto está em andamento, e uma sessão extraordinária foi convocada para votação dos projetos nesta quinta-feira, 29/06, às 17h. O Executivo apresentou duas emendas ao seu próprio projeto, reconhecendo a necessidade de melhorias. Além disso, eu e alguns colegas vereadores apresentamos uma emenda para adequar o texto do Projeto de Lei ao estudo da FIA, removendo a possibilidade de privatização nesse momento. Eu votarei a favor do projeto desde que essas três emendas sejam aprovadas, garantindo segurança jurídica para os servidores e a população, preservando patrimônios estratégicos sob posse da municipalidade após o período de concessão e mantendo o controle acionário por parte da Prefeitura.

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Theodor - 29/06/2023 02h48
Durante a campanha da prefeita nunca se falou da privatização do DaEV. Fomos todos enganados!
Theodor - 29/06/2023 02h48
Durante a campanha da prefeita nunca se falou da privatização do DaEV. Fomos todos enganados!